segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

CASA GRANDE E SENZALA EM QUADRINHOS

A REPRODUÇÃO E A NATURALIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA RACIAL E DE GÊNERO NAS SALAS DE AULA


A imagem e o comentário acima foi retirado da obra intitulada “Casa Grande & Senzala em Quadrinhos”. Trata-se de uma versão juvenil e facilitada,republicada no ano de 2005 pela Fundação Gilberto Freyre e Global Editora.


A VERSÃO EM QUADRINHOS DO LIVRO É UTILIZADA EM DIVERSAS ESCOLAS DO PAÍS.

O livro em quadrinhos se propõe a reproduzir uma visão distorcida e discriminatória da História do Brasil, perpetuando uma interpretação centrada no olhar da Casa Grande e invisibilizando a participação política, intelectual e econômica da população negra e indígena pela própria versão desses sujeitos.

As imagens e frases reproduzem, de forma simplória e equivocada, o mito da democracia racial, que, por meio de um processo de revisionismo, desconsidera a opressão, tortura e exploração ocorridas na escravidão colonial, escamoteia e naturaliza os processos de violência física e simbólica sobre crianças, mulheres e homens negros e indígenas. Chegam ao extremo de dar explicações inacreditáveis às práticas de tortura contra escravizados/as.

Naturalização da opressão e violência contra as mulheres negras e indígenas

Na obra contestada, o recurso à imagem potencializa exponencialmente os efeitos danosos da argumentação que, em si mesma, pode ser considerada um libelo racista e sexista: são imagens plasticamente perfeitas, atrativas, que corporificam visualmente as idéias que o texto
apenas sugere.

Ora, a carga simbólica que trazem os desenhos de mulheres negras e indígenas nuas ao lado de homens e mulheres brancas vestidos, e que mostram crianças negras “montadas” por crianças brancas, e outras imagens de igual teor, vem ao encontro de um imaginário nacional em que mulheres negras e indígenas são desconsideradas em sua dignidade humana, reforçando o caráter de objeto sexual e de despersonalização com que o processo de formação nacional as tratou, justificando este imaginário.

A relação de poder estabelecida sobre mulheres indígenas, que se trata hoje do reconhecimento histórico exigido pelos movimentos indígenas brasileiros, é distorcida de tal modo a representar os corpos das índias ressaltando uma suposta “sensualidade natural”, criando modelos idealizados das mesmas que, pela idéia transcrita no texto, se submetiam como objetos de desejo sexual do colonizador.

Da mesma forma, as mulheres negras são descritas como seres de sexualidade ativa e tão-somente objetos de prazer do homem português, considerado, por essa espécie de opressão, mais “tolerante” que outras nacionalidades de colonizadores.

A imagem da mulher negra e indígena vem sendo veiculada, ao longo destes 508 anos de
história, com base em um paradigma, que é o da inferioridade e desconstituição de sua
humanidade. Como desdobramento desse paradigma, podemos elencar inúmeros prejuízos.

A discriminação resultante da utilização destes estereótipos está não somente na violência simbólica contra a mulher; há ainda que se considerar os efeitos deste paradigma no que se refere à violência física e psicológica, concretizada nos números do tráfico de seres humanos, da violência sexual, doméstica e infra-familiar contra meninas e mulheres.

Tais formas de violência traduzem o sentido de dominação sobre o corpo feminino, um sentido que surge cinicamente na publicidade em geral e nas novelas e se concretiza na crença da superioridade masculina que resulta nos espancamentos, assédios e abusos sexuais, representando o poder que se busca impor através da satisfação dos interesses, desejos ou dos conflitos doentios dos algozes, sejam eles sexuais ou emocionais, mas também dos cidadãos e cidadãs comuns que constroem suas identidades, expectativas e desejos num dos únicos espaços em que têm acesso a outras linguagens e expressões culturais além daquelas da sua comunidade, que é através da mídia de massa. Repetidamente expostos a essas idéias, têm um potencial maior para repetirem esses mesmos valores.

Da mesma forma, esse paradigma confirma a naturalização das desigualdades de gênero que, articuladas às desigualdades raciais, se apresentam nas assimetrias quanto aos direitos sociais, econômicos e culturais, das quais o segmento mais vulnerabilizado pela fragilidade das instituições garantidoras do acesso à justiça é, sem sombra de dúvidas, o segmento de mulheres negras.


FONTE: OBSERVATÓRIO DO NEGRO.

Um comentário:

Marcia Moraes disse...

Que lindo o blog, a iniciativa e as participantes!

Saudações!

Marcia